Diretor do Denatran diz que é preciso rever conceitos e diminuir o peso do Estado sobre o cidadão
Publicado em: 09/08/2019Na última terça-feira (07) o diretor do Portal do Trânsito Celso Alves Mariano conversou com o diretor-geral do Denatran Jerry Adriane Dias Rodrigues, em seu gabinete, em Brasília.
Dias é Policial Rodoviário Federal há 25 anos e atuou na educação, na formação de policiais e na instrução de trânsito em diversos locais.
“Sei da importância da educação na mudança de comportamento”, afirma.
O diretor do Denatran lembra que o Código de Trânsito Brasileiro fala em educar para o trânsito desde os primeiros anos escolares, o que ainda não foi possível implementar. “Se não conseguimos isso, como vamos querer, quando esta pessoa é adulta, transformá-la em um bom condutor? Porque o trânsito não é somente cumprir regras, conhecer a sinalização, as normas e saber operar o veículo. Não é isso. Trânsito é um exercício de cidadania. Nossa constituição fala do direito de ir e vir e o trânsito é um palco de relações muito complexas. Todos, de alguma forma, estamos nos relacionando dentro do trânsito. Então, a formação do condutor não pode ser resumida àquele momento em que ele está se preparando para fazer a prova para receber a sua CNH. Não podemos desconsiderar o todo para discutirmos setores”, explica.
Ainda sobre o processo de formação de condutores, Dias fala que é preciso diminuir o peso do Estado sobre o cidadão. “Faremos isso reduzindo custos e fazendo controle. Esse controle é monitorar as ações, avaliar resultados e até mesmos reconsiderar decisões tomadas no passado, ou mesmo agora, se entendermos que isso seja necessário”, diz o Diretor. Jerry Adriane Dias.
Ações de educação
O Denatran está preparando ações para educação de trânsito, com o objetivo de criar uma estrutura que seja mais perene. Dessa forma, segundo Dias, o cidadão chegará na época do preparo para a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e já terá aprendido coisas básicas. “Por exemplo, ceder o assento no ônibus para um idoso, não deveria depender de uma regra, deveria acontecer naturalmente.”
“O custo da habilitação está muito alto. Assim, temos um efeito contrário: muitos condutores não habilitados nas ruas”, afirma Dias.
No 11º minuto do vídeo, Celso pergunta sobre o problema grave da não medição e não acompanhamento os resultados das medidas adotadas, o que sempre gera uma insegurança no momento de novas mudanças. Dias analisa o histórico conhecido, que aponta reduções pontuais logo após ações importantes, como a implementação do Código de Trânsito Brasileiro e da Lei Seca, com a volta logo depois, dos dados ruins. “Mas carecemos de certezas sobre o que efetivamente conduz a uma mudança de comportamento”, explica.
Dias diz também que é preciso trabalhar a Educação de base para a formação de um condutor cidadão, de um pedestre que compreenda sua responsabilidade, de um pai que compreenda sua responsabilidade em relação seu filho, sem que seja necessário o Estado estar tutelando tudo isso para que esta pessoa seja capaz de cumprir a norma. “Quando eu preciso de Estado demais, há algo que não está bem. A visão do governo é que o cidadão possa cumprir a sua parte e o Estado dê condições para isso”, diz.
Dados de acidentes
A partir do 12ºminuto da entrevista, Celso conversa com o diretor do Denatran sobre dados estatísticos. “É fato de que hoje o Denatran não tem dados de acidentes, apesar de ser competência dele fazer isso. Há alguns anos foi desenvolvido um sistema para isso, mas o que temos é um banco de dados vazio, porque as informações não foram alimentadas”, aponta Dias.
Custos
Jerry Adriane Dias fala sobre as taxas dos Departamentos Estaduais de Trânsito. “O governo não quer prejudicar nenhuma iniciativa empresarial, mas não quer muito peso para o bolso cidadão. Temos conversado com os DETRANs para compreender porque há tanta diferença nos valores das taxas cobradas do cidadão. Diferenças de até 1000%, em alguns casos! Uma das ideias é padronizar os tipos de serviços para que sejam iguais em todo país. Os estados continuarão a ter sua liberdade de estabelecer suas taxas, mas teremos condições de fazer comparações”, garante.
Ainda sobre custos o diretor do Denatran reconhece que os custos para o cidadão não são só da iniciativa privada, mas dos serviços do estado também. “Muitos dos custos surgiram como decorrências das normas emitidas pelo CONTRAN. O trânsito agora teve o seu patamar elevado, com CONTRAN no nível ministerial. O Ministro Tarcísio Gomes de Freitas está acompanhando tudo e participando das discussões. O próprio Presidente tem se envolvido como nenhum outro fez, em relação ao trânsito. Você pode não concordar com o que ele tem falado, mas é inegável que o assunto trânsito nunca tinha recebido tanta atenção e sido debatido de forma tão clara, por parte do governo federal. Estamos mudando a visão e estamos preparados e abertos para inovações. Se não, ficaremos parados no tempo e sem resultados efetivos, o que não nos levaria a lugar nenhum”, finaliza.
Para onde vamos? Teremos EAD? Os DETRANs darão conta de avaliar corretamente?
No 16º minutos Celso, ponderou que as diferenças entre os DETRANs vão além das taxas, ocorrem também nos protocolos e cumprimentos das regras do CONTRAN e, considerando ainda evoluções no processo, como o uso do EAD, tantas vezes ventilado pelo próprio Denatran, reforçam em muito a importância da qualidade das avaliações, pois há uma estrita e direta relação da qualidade da avaliação com a qualidade do processo que lhe precede. E perguntou: quanto à capacidade dos DETRANs em fazer boas avaliações, com todos os defeitos que vemos no sistema atual, com inúmeros problemas com banco de questões e mesmo com critérios de avaliação prática, o que podemos esperar?
A partir do 20º minuto, Dias responde que o Denatran criou um fórum permanente com os DETRANs para estudar em conjunto soluções para esta necessária melhora de qualidade e padronização do processo, inclusive quanto ao banco de questões. Dias concorda que a avaliação deve estar focada no que é relevante e não apenas ao que é pertinente ao tema trânsito. Ele afirma que o Denatran vai buscar, mais uma vez, a formação de um banco nacional de questões que sejam adequadas a uma avaliação efetiva capaz de contribuir para uma formação adequada.
Qual é o futuro dos CFCs? Teremos um novo Código de Trânsito Brasileiro?
Celso questiona, no 24º minuto, sobre as intenções do governo quanto às modificações do Código de Trânsito Brasileiro. Após mais de duas décadas, o CTB sofreu muitos remendos, feitas pelo CONTRAN e pelo Congresso, e há alguns projetos que causam muita preocupação, como o PL 3781/19 do Dep. Federal Gal. Peternelli, que inclusive mexe profundamente no papel dos CFCs e dos instrutores de trânsito. Há como aprimorarmos e aproveitarmos o que temos? Está na hora de um novo CTB? O governo pensa em propor uma alteração global no CTB?
“Há mais de uma centena de PLs, que interferem no CTB, tramitando no Congresso, além do PL enviado pelo Governo. Fazer uma alteração muito grande, estrutural, demanda uma análise muito completa e cuidadosa. Consideramos a possibilidade montar um grupo que trate de um novo Código, revendo alguns dos conceitos do CTB”, afirma.
Dias considera que, apesar de ser novo, o CTB foi construído com um certo olhar no passado. Daí a necessidade dele ser revisto.
Para ilustrar o seu pensamento ele questiona, por exemplo, qual é a efetividade da penalidade de suspensão do direito de dirigir, da forma como ela é feita hoje? Segundo ele, podemos ter um condutor que tem mesmo um comportamento de risco, ou alguém que esqueceu duas vezes de fazer a transferência do seu veiculo no prazo, esqueceu um licenciamento, ou descumpriu o estacionamento rotativo, e daqui a pouco chega aos 20 pontos sem ter sido, de fato, um risco para o trânsito.
“Devemos tirar do trânsito, ou punir, os condutores de risco, não quem estaciona de forma irregular. Mas é preciso uma análise técnica apurada e, em função disso, optamos neste momento por apresentar proposta de mudanças de alguns pontos.”
Ele considera que estamos em condições de, no próximo ano, começar a discussão de um novo Código, revendo o que temos, tomando como modelo outros países, buscando um modelo menos burocrático.
“Quando o Presidente fala em aumentar a pontuação, causa espanto, mas consideramos ser muito mais importante, neste momento de dificuldades, de crise, de falta de pessoal e de recursos, atuarmos nas condutas de maior risco. Levamos isso em conta e colocamos no PL uma redução no número de instâncias administrativas. Este é um aspecto positivo pouco percebido e pouco falado”, argumenta o Diretor.
Para Dias, por ter sido encaminhado como Projeto de Lei, a sociedade tem, através de seus representantes, a oportunidade de debater e discutir se é isso mesmo que ela quer, ou se alguma outra alteração deve ser feita.
Eventualmente, estas propostas podem atingir determinados segmentos que investiram neste setor. “É importante considerar o quanto o processo custa para aquele cidadão que muitas vezes não tem condições de pagar, e então construirmos algo que seja razoável. Não impondo, mas dando a oportunidade do cidadão fazer o que precisa para se preparar bem”,
EAD
A partir do 30º minuto, Dias fala sobre o polêmico EAD. “Temos que avaliar todas as opções, inclusive a Educação a Distância, que se espalhou no mundo inteiro e que é uma realidade da qual não podemos fugir”, defende.
“Temos que nos adequar as tecnologias. Não podemos ficar para trás”, afirma.
Denatran digital
À propósito, sobre transformação digital (31º minuto), o Denatran está se aprimorando. Dias fala sobre soluções tecnológicas para notificação eletrônica,CRLV e CNH (veja aqui). “Várias informações e comunicações poderão ser feitas por smartphone. A ideia é tornar as coisas mais fáceis para o cidadão, mais baratas e com maior segurança, é nisso que estamos trabalhando aqui”, conclui Dias.
Assista na íntegra:
Fonte: Portal do Trânsito